No terceiro ataque de tosse no meio da madrugada resolvi levantar, fazer xixi e tomar mais água. Aí que ouvi a escavadeira. Não acompanhei a previsão do tempo no dia anterior, mas parece que tinha nevado...
Fiquei com preguiça de ir ver o quanto de neve caiu e voltei para a cama.
O corpo estava moído por esse vírus. Começou com uma ridícula dor de garganta, foi para uma dor generalizada no corpo, a dor de garganta aumentou e estava bem difícil de engolir. Fazia quantos anos que eu não tinha algo assim? Eu estava confiando que o própolis e todo o líquido tomado nos últimos dois dias iriam dar jeito na coisa, mas quando acordei na segunda com uma dor ainda maior, pensei: droga, é uma infecção e vou ter que tomar antibiótico para fazer essa bosta ir embora.
Eu aqui reclamando de antibiótico quando há algumas dezenas de anos atrás pessoas MORRIAM de dor de garganta. Ou de uma ferpa no dedo. Ou de um corte com um prego. Hoje é ridiculo de se pensar que alguém morreria de causas assim. Mas minha preocupação foi legítima. Um texto lido há algum tempo explicava que poderíamos estar caminhando para um apocalipse dos antibióticos. A explicação é simples: as pessoas estavam usando antibióticos para tudo. Dor nas costas, inflamações variadas e gripe. A falta de educação tanto formal quanto de base faz com que as pessoas não entendam o risco de se usar antibióticos a torto e a direito. Como o texto dizia, o uso indiscriminado desse medicamento tem criado bactérias super resistentes, as quais não há mais antibiótico que destrua. Como isso pode acontecer? Quando não tomamos as doses recomendadas para acabar de maneira total com o ciclo da bactéria (os sintomas melhoram, a galera pára de tomar antes de fechar os 5 ou 7 dias) restam algumas bactérias que acabam resistindo àquele ataque, são as mais fortes, e essas vão atacar outro corpo ou ser vivente. Para essas, esse antibiótico já não faz mais efeito. E é assim que o texto dizia que estamos ficando sem antibióticos para diversas infecções.
É por essa razão que nos últimos 7 anos eu devo ter tomado antibiótico umas duas vezes. Uma quando tive uma leve dor de garganta trabalhando no correio dos EUA. Pela dor eu jurava que o própolis ia dar conta, mas a gerente, morrendo de medo que fosse covid (não tinhamos vacinas ainda) mandou eu ir testar. O covid deu negativo mas aqui fazem um teste na garganta para streptococus. Isso também era novidade para mim porque os médicos brasileiros-raiz sempre definiram se minha dor de garganta era bactéria ou vírus simplesmente olhando para ela. Sim, bactéria faz pequenos pontos brancos (desculpa o jeito, caro leitor, mas são de pus mesmo) e vírus não faz os pontos brancos. Nada como ser curiosa e perguntar tudo, não?
Pois bem, no país mais pragmático do mundo se faz teste para saber se é bactéria na garganta e nos idos de agosto de 2020 este voltou positivo. Fui para casa com uma recomendação de não ir trabalhar por 7 dias para evitar contaminação com colegas e antibiótico por todo esse período. Achei um exagero primeiro porque estávamos usando máscaras e mantendo distância o tempo todo, segundo porque eu não tinha dor suficiente para tomar remédio por tantos dias e a strep vive no ar, não? Mas, enfim, segui à risca, já que sabia do tal ciclo e não queria ser responsável por mais uma super bactéria criada nas minhas entranhas.
A segunda vez que tomei antiobiótico foi por 3 dias para evitar uma inflamação numa cirurgia dentária feita as pressas na minha viagem ao Brasil há 20 dias. Havia uma inflamação crônica (quando não dói e a resistência do corpo mantém sob controle) num canal antigo e a dentista me disse que tive sorte disso não ter piorado com a diferença de pressão no avião, o que ela diz que é muito comum.
Pois bem, agora de volta de um Brasil úmido de temperaturas de 28 C, para as temperaturas de -12 C secas do Maine, era de se esperar que algo acontecesse. Normalmente dores de garganta começam comigo por coisas não ditas ou raivas contidas. Não havia nenhuma dessas razões já que, depois de uma análise, constatei que tudo tinha sido dito, ou escrito ou expressado.
Chegamos na sexta, pegamos as malas correndo para ver se alcançaríamos o ônibus das 12:35 de Boston para Portland. O ponto do ônibus mudou, não havia sinalização e o motorista passou acenando, mesmo vendo que corriamos feito loucos com as malas. Perdemos, claro. E no processo, esfriei o corpo muito rápido, quase congelando as mãos. Esse frio repentino, ajudado com a secura do ar devem ter sido a causa maior dessa inflamação, pensei. Fazia tempo que eu não sentia dor assim na garganta. Que acordava sem conseguir engolir saliva. Que sentia que um caminhão tinha me atropelado.
A primeira ideia foi fazer o teste de covid em casa mesmo, no sábado. Negativo. Ufa. Mesmo assim a coisa foi evoluindo. Enfim, a dor piorou e vi que própolis e limão não estavam dando conta. Decidi que era hora de ir ao médico e se tivesse que tomar o tal do antiobiótico, eu tomaria.
Fizeram ambos os testes. Para Covid, dessa vez o PCR, e o de strep. O de strep deu negativo e o PCR de Covid sairia somente no dia seguinte. O médico veio, olhou a garganta para confirmar que não era bactéria mesmo. Não achou os pontinhos brancos. Conversamos.
- é vírus então?, perguntei.
- Sim,
- De gripe?
- Ou Covid, disse ele.
- Então, o que me resta é fazer meu corpo brigar, certo?
- Exato, seu corpo já está brigando. Dá para ver. Para diminuir o desconforto, tome ibuprofeno.
- Ok, obrigada.
Saí do médico de certa forma feliz de não ter que tomar antiobiótico. Salvemos isso para situações realmente periclitantes. Mas eu sabia que agora estava comigo e meu corpo a missão de brigar com esse vírus. Sei que posso ajudar minhas defesas. Juntei o arsenal. Sucos de todos os jeitos, com espinafre, couve, limão, etc. Fiz limpeza das vias aereas com água fervida e gotinhas de centella asiatica (jalaneti). Gargarejos revezados com sal e essência de tea tree. Descanso e meditação curativa, imaginando uma luz verde ajustando as coisas na minha garganta e vias aereas. Comida leve e saudável.
Foi rápido. Quando decidi levantar pela segunda vez à noite e checar a janela, a neve estava caindo de novo mas minha garganta não doía mais. Pode ter sido qualquer um dos tratamentos ou todos juntos. Mas eu tenho certeza que poder ficar na casa protegida, na cama quentinha podendo ver a neve só pela janela faz uma imensa diferença. E ainda contando com uma enfermeira super atenta.
Enfermeira Pandora |
O que eu não esperava, depois de tantos testes negativos de Covid que fiz, era que esse viria positivo. Uma certa indignação tomou conta de mim no início porque deixei de ver um punhado de pessoas no Brasil e virei a chata da distância e da máscara. No fundo eu estava com um medo gigante de passar esse vírus para a minha neta que não tinha sido vacinada ainda pela idade, e para a minha mãe, que tem um punhado de outras doenças. Meu lado Pollyana veio junto com o lado de rodar-a-baiana.
- Pelo menos foi agora, na volta, você pode se isolar em casa e não passou para ninguém mais frágil., disse a Nivea-Pollyana
- Isso é o que você imagina, falou a Nivea-roda-a-baiana. Vai que você passou antes de vir?
- Mas você testou negativo um dia depois de chegar..., rebate a Nivea-Pollyana.
Bem, não preciso dizer que essa discussão se estendeu enquanto a temperatura lá fora foi caindo ainda mais.
Depois do choque do resultado, saí avisando todas as pessoas que contatei nos últimos dias. O foco, então, voltou para enfrentar isso da melhor forma possível, já que vacina, eu tinha as três doses. Chá fortalecedor da Ayurveda (obrigada, Dani!), suco de folhas e frutas com limão inteiro, jalaneti (esse negócio funciona muito, porque saiu horrores do meu nariz), meditação, comida saudável, e um ibuprofeno para aliviar a dor pelo corpo. Além disso tenho uma galera da oração mandando sempre aquela energia positiva (obrigada tio Nelsinho).Sem falar na legião de amigos checando como estou e oferecendo apoio de longe e de perto.
O suporte estatal também impressionou. Faz dois dias desde o teste positivo e já recebi ligação da enfermeira indicando sobre o tempo de isolamento, comunicação a contatos e monitoramento dos sintomas, duas ligações do CDC Maine perguntando quando cheguei de fora, se tinha me vacinado, como estou me sentindo e se preciso de qualquer auxílio social e um SMS dando mais dicas de procedimentos.
Enfim, a Nivea-Pollyana ganhou nessa discussão toda. Porque se era para pegar esse negócio, foi depois da vacina, com sintomas muito mais leves do que muita gripe que tive e a possibilidade de isolamento efetivo sem colocar parceiros de trabalho ou família em risco. Onde peguei ou como? Vai continuar sendo uma incógnita.
As temperaturas vão aumentar um pouco (dos -19 para -5 C) mas teremos uma imensa tempestade de neve nesse sábado, que vai acabar mantendo todo mundo em casa. Eu vou me cuidar e me recuprar honrando todos os que não tiveram as mesmas oportunidades que eu para enfrentar essa doença. É em respeito à memória deles e à tristeza de seus familiares que vou fazer de tudo para parar esse vírus aqui em mim.
Ômicron pegando geral! Amanhã vou testar, à revelia de todos os múltiplos cuidados!!! Bj e melhoras!
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ExcluirSe cuide, amiga! Já já vc está boa de novo! <3 Nós estamos em isolamento também até saírem os resultados dos exames. Beijos!
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