Esses dias eu estava "rolando o feed" de uma das redes sociais e me deparei com um título sobre Madonna. Lembrei, então, da minha ídola da adolescência, que faz um quinquilhão de anos que não acompanho, e cliquei no artigo/post. Não a reconheci. A ponto de procurar se foi lançada de repente uma outra Madonna nesses últimos 10 anos de não ler/ouvir nada sobre ela. Procurei outros artigos e textos e fotos para me certificar e, realmente, aquela era a mesma Madonna da minha adolescência, super produzida como sempre, mas com um lábio 5 vezes maior do que o que ela tinha, escondendo um sorriso que sempre achei lindo. Eu estava curiosa para saber como ela tinha envelhecido, já que fiquei tanto tempo sem saber de sua vida. E pouco mudou.
Não, não estou aqui para criticar qualquer tipo de alteração corporal ou ajustes que alguém queira fazer em si. Tenho idade - e imagino que maturidade - suficiente para entender que cada um sabe de si, sabe onde o calo dói (velha essa expressão, nem sei se galera sofre com calo mais) e o que precisa fazer para se sentir melhor.
Minha questão principal aqui é: onde eu estava esse tempo todo? Estava tentando acompanhar um mundo que diuturnamente tem me atropelado. É muita informação, de todas as direções. E aí juntemos essa enxurrada de signos que tenho que ficar escolhendo se vou prestar atenção ou não com toda a revolução que está acontecendo aqui dentro. Sim, porque faz tempo que tenho percebido mudanças radicais acontecendo em mim e que preciso de tempo para assimilar, digerir e decidir se me pertencem ou não.
Nesse processo ando repetindo várias vezes que estou ficando velha. Sim, todos estamos, minha gente. Mas há algo de muito grave quando verbalizo essa expressão. Invariavelmente, sempre que comento com alguém a fatídica frase ali de cima, um mini chilique nasce na cabeça do meu interlocutor, ferve e explode externamente em comentários: "imagina!!!!", "você está ótima", "você aparenta ter metade da sua idade".
Os comentários vem nos mesmos moldes de quando a lepra não tinha cura e alguém se achava com a doença. Ou há bem pouco tempo atrás quando alguém era diagnosticado com câncer. Minha primeira sogra me falava que o nome da doença não era dito porque significava a sentença de morte. E um pouco mais recente, quando alguém dizia que tinha HIV. Gente, isso foi ali, numa esquina do tempo. Em minha vida eu vi a doença vir, matar um monte de gente e ser controlada pela ciência. Mas enquanto significou morte certa, falar sobre ela era um horror.
Não falamos sobre coisas que denotam o nosso fim.
A ironia disso tudo é que a única coisa certa dessa vida, a única da qual temos certeza absoluta e podemos jurar de pé junto é que vamos morrer. A morte é certa, absoluta, presente! (Graças a deusa, porque eu ia achar muito tedioso ser uma highlander).
O problema é que mesmo sabendo que vamos morrer e que há uma caminhada até lá, que inclui ficar velho, a gente não aceita. Fecha o olho, vira a cabeça pro lado, não quer saber. O mundo ajuda criando centenas de tratamentos e suplementos e cremes e cirurgias para ir enganando o tempo.
Ficar velho nunca foi permitido. E aí que pouco se discute, pouco se prepara, não se trabalha isso. Não ignoro os movimentos do cabelo branco e outros de real envelhecer que estão se achegando, aponto que ainda são poucos.
Lembro que um dos nossos projetos de final do curso de jornalismo nos idos de 1997 foi uma revista para idosos. A ideia era nova, minha gente... Tanto que esse projeto ficou empilhado na mesa do professor que também trabalhava numa redação de jornal e o editor adorou a marca que criamos e a usou para a sessão que falava de idosos do jornal (direitos autorais mandam lembrança). Em 1997 a galera estava começando a entender que velho é também público-alvo numa das províncias mais conservadoras do Brasil.
E hoje, eu sou a velha.
E tento assimilar essa realidade todos os dias depois que mandei fazer três óculos para usar em diferentes situações.
A realidade foi batendo à minha porta de um jeito bem incisivo. Primeiro foram os óculos, aos quarenta. Eu usei quando era adolescente, porque tinha hipermetropia e acabei largando porque o olho cresceu e os graus diminuíram para menos de 0,5. O olho, elástico o suficiente na época, se adaptava para focar algumas coisas. Depois dos quarenta, os olhos não se adaptam mais e além de não fazerem os movimentos para focar melhor, aparecem graus de astigmatismo e miopia de não sei onde para se juntar aos problemas já existentes. A coisa vai ladeira abaixo mesmo, com a necessidade de lentes multifocais (porque eu preciso para perto e longe), de lentes só para perto para não ficar com dor no pescoço na frente do computador e lentes só para longe para poder ver TV deitada. Complica mesmo. Esse arsenal todo eu fiz em 2018 e já está ultrapassado. Eu sinto. O multifocal reflete as luzes dos carros de noite parecendo um sol na frente do meu olho e isso tem me incomodado mais do que o normal. Ler com o abajur já ficou difícil mesmo com os óculos de perto, porque as letras realmente estão muito pequenas... Esses dias fui tirar a máquina de costura do armário para fazer uma saia e demorei uns 20 minutos para por a linha na agulha da máquina. Deu uma tristeza naquele momento. Grande o bastante para eu ligar para a minha mãe pedindo colo e perguntando para a septuagenária (que teve somente 20% da visão em um dos olhos a vida toda) como ela põe a linha na agulha. A resposta foi mais tranquilizadora: faz tempo que uso lente de aumento para essas coisas, filha. Eu não tive coragem de perguntar desde quando ela as usa...
Isso tudo é reflexo de algo muito normal: estou ficando velha.
O corpo, então, tem mandado vários sinais muito claros. Se eu não fizer meus exercícios todos os dias, alguma dor vai aparecer. Sem dúvida. A artrite no dedo do pé chegou bem cedo. Não estou bem certa, mas acho que teve a ver com os pouquíssimos anos de dedicação ao tango, mas também com a falta de conhecimento de como alocar os meus pesos em cada parte do corpo. Eu lembro de ter saído da médica chorando quando ela me disse que minha articulação do dedo do pé só ia piorar com uma atividade bem simples: caminhar. Nesses anos (uns 10) eu aprendi a conviver com a dor que vai e vem, com o endurecimento da minha articulação e com a opção de dispensar o salto alto. A frase que a minha amiga Rosana me disse no doutorado ressoa toda vez que penso nas articulações: "depois de certa idade, você vai sempre ter alguma dor, e vai aprender a conviver com ela."
Ela tinha toda razão. Aprendi e assimilei que estou ficando velha.
O joelho foi esse ano.
Depois de aceitar trabalhar como carteira ano passado eu descobri duas coisas: que os cristais que ficam dentro do labirinto - os que definem o equilíbrio, que informam o cérebro se estamos de ponta-cabeça ou nos movendo - ressecam e partem com a idade e se movem dentro do canal enroscando-se onde não deveriam produzindo fortes tonturas. Os médicos não admitem, mas depois de ter 5 episódios horríveis, com durações não menores de dois dias, eu tenho para mim que além da velhice esse processo está relacionado com estresse. Eu continuo envelhecendo mas não tive mais tontura depois que parei de ter picos de estresse.
A segunda coisa foi uma crescente dor no joelho, também esquerdo. Deve ter a ver com a artrite no dedão, claro, porque está tudo interligado. A verdade é que, depois de Raio-x, médico, acupuntura, fisioterapia e suplementos antiinflamatórios, a dor pode ser controlada. Vem e volta. O problema é o barulho constante de clique-clique toda vez que subo uma ladeira ou escada. Pior ainda, toda vez que danço salsa ou forró. Flexionar o joelho é ouvir o clique. E não preciso dizer que esse barulhinho me enlouquece, não é? Mas antes de pedir demissão de um trabalho que fazia eu caminhar 15 quilômetros por dia, eu perguntei para o meu primo fisioterapeuta se havia jeito de curar esse joelho, algo definitivo. Ele respondeu como um cavalheiro como sempre: "Com quantos anos você está? Olha, Ni, depois dos 45, tudo no corpo vai começar a dar sinais e pequenos problemas."
Ou seja, estou ficando velha. E pior, não há volta. Mas onde está a novidade nisso tudo?
A menopausa é o próximo capítulo, pelo que parece. Ela tem mostrado sinais de estar chegando. Os calores, experimentei no pico do inverno do Maine, em 2020, falhas na menstruação têm ficado mais comuns e a variação no humor é bem clara, apontando uma bagunça hormonal menos definida do que TPM. Quando comecei a ter os primeiros sintomas saí pesquisando e descobri que talvez seja melhor cortar os pulsos antes de entrar na menopausa. É um tal de perda de cabelo, de colágeno, de flexibilidade, de umidade, de humor. Aqui já não é mais ladeira abaixo, é como se tudo que já vivi e fui fosse jogado abismo abaixo... Aí a sororidade ajuda: "Toma hormônio"; "Não perde a umidade, não"; "Comigo foi um horror"; "Quando eu tinha os flashes ia lá para fora com -10 graus e resolvia"; "Para mim foi tranquilo, liberdade afinal"; "Uma dor muscular horrível nas costas"; "Exercícios, yoga e uma alimentação natural resolvem".
Aos poucos eu vejo a idade vindo, as coisas mudando e quero tomar conhecimento, passar por isso consciente dessas transformações. Por isso vou continuar repetindo que estou ficando velha rejeitando qualquer tipo de consolo superficial de que não pareço ter minha idade, que estou ótima, que ninguém imaginaria, bla bla bla. Eu estou cagando para o que parece. A transformação está acontecendo aqui dentro e eu quero estar atenta, quero perceber, quero assimilar. Estou ficando velha e pronto, é uma constatação.
E descobri que a melhor reação a essa constatação é aquela que trata essas transformações - inclusive as de memória e cognitivas - com naturalidade. Há dois dias eu entendi como quero ser tratada e esse exemplo veio do meu sobrinho.
Eu liguei para ele para saber mais sobre os controles de playstation 4. Eu queria comprar um para o meu afilhado para quem eu já tinha pedido um link com exemplos - e ele tinha mandado - mas queria entender mais sobre o negócio já que quando eu procurei na internet apareceram umas 150 opções. Como nunca joguei Playstation na vida e não tenho conhecimento de causa, fui buscar quem entende.
Com a câmera do celular, falando com ele, eu fui mostrando as opções que estavam na tela do computador para o meu sobrinho, perguntando porque haviam tantas cores.
- são só opções de cores, tia. Os botões são os mesmos.
- E porque que aqui diz Vibration Shock Game? Esse negócio chacoalha também?
- Ah, sim, ele transmite a tensão do que está acontecendo no jogo.
- Hummm e esse aqui que não tem nada de botão aqui na foto? Para que serve?
- Essa é a foto do verso do mesmo controle, tia.
Não tinha como não me sentir uma idiota. Óbvio que era o verso do mesmo produto. Dãrd. Mas o que mais me impressionou foi que não teve risinho jocoso ou cara sarcástica do sobrinho que sabe das coisas e eu não. Ele deu todas as explicações com um cuidado, respeito e carinho que me impressionaram. A normalidade.
Risadas tivemos aqui em casa, quando eu, falando com o filho via câmera do celular, resolvi comentar sobre o link de um artigo que me enviaram, e fiquei tentando encontrar o mesmo celular com o qual eu estava falando com ele para enviar o link...
É, sou a nova versão da pessoa que procura o óculos que está na cabeça. É velhice? Pode ser. E está tudo bem.
Sonhei com você a umas duas noites atrás, você estava ótima, como quando te conheci.
ResponderExcluirVocê havia voltado e então eramos vizinhas, queria te contar que estou grávida agora, aos 35 caminhando para a minha velhice também, porém com gêmeas. (As vezes sinto um pânico, mas esta tudo bem). Todos os dias dou tchau para uma janela que não tenho certeza se era a sua, ensinei a Juliana dar tchauzinho também... Enfim, só para saber que mesmo ficando velha e caminhando para outro lugar, rsrsrs, é e sempre sera lembrada por mim, além dos outros vários amigos e familiares, claro. Saudades Nívea Bona.
Mulher!! Que saudades!! Que notícias fantásticas! Eu nunca esqueço de você e de seu caráter tão forte. Vai dar tudo certo com as gêmeas. Vai ser lindo e recompensador. Vc é lutadora e saberá como e quando precisarão de tudo que você pode dar. Se formos vizinhas como o sonho mostrou, pode deixar que a vó aqui ajuda nos desafios. Em frente sempre minha querida!
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