Para respirar. Aliviado?

*alerta de spoiler: vou falar sobre o livro Tuesday with Morrie, ou a Última Grande Lição, de Mitch Albom.


A gente não percebe o quanto tem como certas, coisas que são efêmeras. Em tempos em que um vírus chega sem pedir licença ou avisar, que deixa humanos prostrados, com febre, tosse, dor no corpo, sem sentir o gosto, o cheiro, ou ainda respirar normalmente, o que era detalhe toma contornos dramáticos.


Respirar. Eu estou fazendo isso agora, você está fazendo, todo mundo ao nosso redor enquanto leva todas as atividades do dia nas costas, está fazendo. Respirar é muito automático. Comparada a essa atividade só a do coração batendo. Duas ações que movem todas essas máquinas humanas.
Estamos todos aqui fazendo amor, guerra, mudando de casa, escrevendo, cozinhando, sonhando, dirigindo, rindo, chorando, celebrando, brigando, lendo, discutindo, dançando, correndo, porque há respiração. Porque respiramos.


Chega, então, um vírus que afeta exatamente essa atividade para lá de automática, mas ao mesmo tempo, fundamental: o respirar. Poucas são as pessoas que passam a vida com problemas para respirar, que "puxam o ar e ele não vem", como disse uma amiga. A sensação é apavorante. Pais que tiveram a experiência de ter um filho se engasgando sabem bem o que desespero significa.

Alérgicos que se deparam com o descuido de não terem perguntado todos os ingredientes de algum prato e têm que ser levados para o hospital às pressas.

Gente que está numa cama respirando com ajuda mecânica.

Todos têm muito claro, estampado em sua frente, a preciosidade que é respirar. Mas a grande maioria passa batido e nem percebe que há um inspirar e expirar contínuo que mantém as coisas funcionando.

O vírus veio como um justiceiro para nos lembrar de que respirar é fundamental. É a base. É aquilo que não percebemos, mas que é a preciosidade máxima de uma vida. É aquilo que prestamos atenção por alguns segundos quando meditamos ou quando fazemos um exercício de yoga - quando fazemos. É aquilo que alguém diz para a gente e que funciona como mágica quando estamos em pânico: RESPIRA.

Ultimamente, motivados pelas reflexões de quarentena e do risco de morte que o vírus tem trazido para quem ainda respira, o livro Tuesdays with Morrie (1997) vem sendo relembrado por quem o leu num passado muito distante ou nem distante assim. Eu, por coincidência - se é que isso existe - o li para um trabalho de um curso de escrita em inglês. A professora, penso eu, nem imaginava o quanto visionária ela foi quando indicou esse livro para a turma em janeiro.

Mitch, o autor, é um jornalista esportivo que nunca pensou em escrever um livro de memórias. Como o mundo todo, ele se graduou e saiu para o mundo dos adultos, movendo as engrenagens do sistema trabalho, dinheiro, consumo. Então, exatamente como o tempo em que vivemos, ele foi pego pelo acaso. Na verdade, o acaso pegou seu melhor professor com uma doença sem cura: esclerose lateral amiotrófica. O que, em resumo e na própria voz de Morrie, o professor, significava que a sentença de morte foi dada e que ele morreria de asfixia. Ele pararia de respirar.

O que o livro traz é exatamente o que o vírus está trazendo para nós: um rever de tudo o que a gente entende como garantido. A possibilidade de, se ele nos infectar,  morrermos antes do que imaginávamos. E pior, de falta de ar. Ou de falta de capacidade de respirar.

E, assim como os encontros de Mitch com Morrie fizeram, estamos todos revendo o que, afinal, é realmente importante em nossas vidas. Porque se ela acabar amanhã, exatamente porque algo que nunca prestamos atenção - respirar - parou de funcionar, o que foi que fizemos com ela, a nossa respiração? Ou, que tipo de ares respiramos? Ou que ritmo de respiração tivemos? Ou que situações nos deixaram a respiração ofegante ou profunda?

A pergunta que hoje pode estar martelando em muitas cabeças é: o que tenho feito enquanto ainda respiro?



Comentários

  1. Quando acompanhava a respiração do Dorvalino na Uti e vi ela indo e vindo muitas vezes Sai a do hospital e como um extinto puxava o ar com todas as forças e disso a muito. Falava para o meu Mestre que tentava me transformar em uma bia professora e ele dizia que eu entre puxar e esvaziar o ar dos pulmões e realmente respirar estava uma longa jornada. Hoje após 3 anos entendo. Quando você Inala a vida algo sujo sempre sai e muita vibração e energia ficam. E ter á leveza para usar esse filtro depende do quanto vc quer se esforçar para isso. Tem a ver com canalizar o que é bom, ser grata pelo simples e viver ao máximo com o que d pouco. Hoje respiro e rezo para que o maior número de pessoas consiga entender isso. Otimo blogue. Parabéns prima.

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