2020 - GRACIES


Eu fiquei com essa foto da basílica da Sagrada Família em Barcelona por muito tempo como a capa do meu Facebook. Ficava complicado trocar porque eu me sentia agradecida por tudo que a vida tem me proporcionado e a Deusa abençoado. Ser agradecida não significa que as coisas estejam vindo de presente ou sejam fácil. É usar uns óculos para olhar para o copo meio cheio em vez de meio vazio. É ter ciência do que você recebe, tem, é, conquista, ou acontece com você. Esse ano de 2020 não começou fácil nem fofo. Foi hard as hell, como dizem aqui. Isso não significa que não tenham coisas a serem agradecidas. Tem. E várias. E aqui recomeço o meu compromisso de olhar para o mês e apontar diversas razões que me fazem ser muito agradecida.

Janeiro 2020
Eu diria que esse foi um ano que aconteceu em um mês. Olhar para Janeiro dá até uma gastura de tanto que aconteceu o tempo todo.
Eu dei um jeito de escrever um capítulo de livro para a minha amiga Ana. Sou muito grata pela parceria dela e por ela ter me convidado. O assunto fala alto no peito e parece que me chama.
Agradeço também porque fui envolvida muito rapidamente no voluntariado para ajudar os asylum seekers que chegam em Brunswick a se adaptar. E a Deusa me mandou uma numerosa família angolana para que eu seja a helper. Uma família amorosa e alegre que passou por maus bocados para chegar até aqui.
Eu tive vários nãos de trabalho e tive a oportunidade de domar meu desespero diversas vezes. Muitas. Mas também tive ajuda de amigas como a Fer, para entender como meditar ou respirar em tempos tão complicados. Fomos para Bar Harbor algumas vezes para encaixotar a nossa vida. Sou agradecida por ter feito uma limpa nas coisas antes de vir para cá, mas ao mesmo tempo eu entendo que precisamos diminuir mais.
Greg teve o opening do estúdio dele. Veio gente que nunca vimos antes.
A gente se acostumou nesse primeiro mês no quarto alugado. Adaptamos nossa vida por aqui com os dois roommates, Bo e Ojo. Pandora também está se acostumando, mas ainda fica de cara que não tem a casa toda para ela...




Eu comecei um curso de critical reading and writing para melhorar o inglês.

Fevereiro 2020
O mês virou com uma mudança simbólica: trouxemos todas as coisas de Bar Harbor para um storage room em Brunswick. Fomos ajudados por um time de amigos fabuloso (Frank, Gary, Mike, Arojit, Ann). E é como o Cori, amigo do Greg disse: que façamos isso de novo, logo. O que significa que temos que encontrar uma casa para nós rapidinho.
Fevereiro também foi o mês que comecei a trabalhar num escritório de advocacia fazendo os processos para subrogação de seguros. Não foi algo fantástico, duas telas de computador, muitas informações para procurar e acidentes de carros de locadoras para averiguar. Mais de 30 pessoas trabalham lá em silêncio, com a cara virada para a tela de computador, a parede ou uma divisória. Nada muito estimulante, mas eu pensei em tudo que poderia aprender. A parte boa é que o escritório é no Moinho onde Greg tem o estúdio, então eu ia trabalhar caminhando mesmo. Também comecei a fazer yoga depois do trabalho no mesmo moinho. Tudo muito conveniente. Só precisamos encontrar a nossa casa. Greg também começou a trabalhar num restaurante. Então agradeço. Parece que havia um respiro.
time da mudança

entrega das chaves

storage room

storage room
Em Fevereiro também fomos explorar as redondezas da nossa nova cidade e visitamos a Popham Beach. Uma praia de verdade, com areia e tudo e parece-me que é um point no verão. Mas a temperatura quando fomos não estava das mais agradáveis: -10 C. Mesmo assim, a paisagem é de uma lindeza só. Agradeço!
Popham Beach

Gelo de espuma de mar

Uma concha congelada

Um forte perdido no meio do gelo.




Março 2020

Eu poderia pular esse mês. E dizer que ele nunca existiu. Porque agora que eu estou registrando os agradecimentos cotidianos, inevitavelmente os impasses, dificuldades e desafios vêem à tona. Porque agradecimento se refere a dar graças, logo, por algo que é real. E março pode ser colocado com um dos piores meses da minha vida toda. O mais engraçado é que não tem razão alguma externa. Ele foi um mês horrendo, porque eu estava fora de mim. Ou como diz minha gurua, eu estava longe do meu coração. Assim, o trabalho que eu encontrei era detestável (só o trabalho, as pessoas eram formidáveis), a gente foi ver mais de 20 casas, fizemos proposta para comprar algumas e fomos negados. Achamos a casa que os dois amaram, e alguém fez uma proposta antes. Então esse mês me ensinou sobre perdas, sobre a idiotice que é insistir em algo sem ver os sinais dos tempos. E aí veio a quarentena. Eu trouxe o computador para casa e perdi o que mais gostava do trabalho horrendo: os colegas. Marido tb foi suspenso do restaurante. Discutimos muito, semanalmente. Eu fiquei amarga.  Até a hora que decidi largar o controle. Até a hora que decidi que não ia mais brigar para o que eu queria acontecesse. E aprendi sobre resiliência, sobre se curvar e voltar à posição anterior. Essa propriedade de resistir com flexibilidade. Por isso, agradeço, muito. Agradeço tb por termos um lugar para fazer a quarentena, por ter acesso a comida e algumas reservas que não nos deixaram desesperados.



Abril 2020

O mês de abril começou me fazendo chorar muito porque lembrei do mesmo tempo no ano anterior em que eu estava vendo o pai na cama do hospital. Não tinha ideia de como ainda estava traumatizada com tudo. A gente não pode colocar limite em dor de luto mesmo. Mas aí o inferno astral acabou e como num passe de mágica, tudo se acalmou dentro de mim. Foi a decisão de largar mão, foi lidar com o luto, foi celebrar a vida, foi o trabalho novo, no correio, com melhor significado. Foi ter pedido a demissão dos advogados e ficar sabendo que assim que pudessem iria me colocar para ser assistente de uma das advogadas. Nada que me fizesse ficar, mas foi bom saber que meu trabalho foi bem feito, mesmo eu não gostando do que fazia. Eu tinha para mim que eu só era boa no que eu gostava. Depois de velha, talvez a responsabilidade chama mas alto. O treinamento para entregar cartas começou e há muito o que se fazer. Vamos entregar boas novas daqui para frente. Assim, meu agradecimento desse mês vai para a catarse e para o ser fênix, renascendo sempre.


Ponte em Portsmouth. Indo de um momento confuso para um de fé.



Maio 2020

Agradeço que tenho um trabalho que faz uma grande diferença na vida das pessoas por aqui. Enquanto muitos estão passando por dificuldades com a a pandemia ou estão restritos em casa, eu tenho a rua para mim. Sinto que sou de uma utilidade maior quando tanta gente não pode estar se expondo ao vírus e eu tenho menos risco e posso entregar o que todo mundo precisa. Maio foi mês de descobrir a cidade de Bath e me encantar com as diferentes rotas e cenários que encontrei cada vez que entregava cartas e pacotes. Fiz amizade com animais diferentes e ri de tiradas engraçadas de clientes.Primeira vez que encontrei uma cobra aqui no Maine também. Agradeço pela abundante natureza que me rodeia e pela possibilidade de estar no ar livre.

                                                
The cat on the PO´s car hat.
Aventuras no Maine selvagem

Junho 2020

 Agradeço pelo verão que chegou tranquilo. Agradeço por todo o exercício que estou fazendo e perdendo peso. Agradeço pelo meu corpo estar me ajudando a trabalhar bem. Agradeço que fui a Freeport entregar as cartas e aprendi bem. Agradeço por tudo de novo que fui aprendendo sobre o correio e as aventuras que tenho vivido. Agradeço que pude tirar dias de folga com o Greg e fomos para Wiscasset. Agradeço tb por poder retornar meu tênis que furou nas caminhadas e receber outro, pelo cartão hand-maid pela minha marida, porque Pandora ficou no correio enquanto eu terminei a entrega das cartas e pelo passeio no barco do sogro onde eu não enjoei.





Família no barco e eu sem enjoar. Um feito.

cartão da marida que esquentou o coração


  Julho 2020

Eu quero agradecer pela crise de vertigem que tive que acabou por me dizer que eu tenho que aprender a dizer não e não ficar puxando meus limites. Foi o começo de uma viagem para dentro de mim que me ensinou muito sobre a minha relação com o trabalho. Agradeço por ter emprego durante a Pandemia, por podermos continuar no quarto da casa MSMT. E agradeço por não termos fechado a compra de nenhuma casa. Na hora a gente não entende, mas um tempo depois a gente vê que foi o melhor que poderia ter acontecido. Enfim agradeço por essa mão invisível que parece que traz tudo de errado mas no final das contas para para encaminhar mesmo.



Agosto 2020

Sou agradecida pela internet e por poder falar com a Lily praticamente todos os dias. Adistância e a pandemia não estão sendo fáceis mas entendo como um treino para se estar mais forte. Agradeço porque temos ese quarto para morar, agradeço por que estamos treinando a paciência com os estudantes com os quais dividimos a casa e agradeço e todo mundo ao meu redor está com saúde. Agradeço também pelas oportunidades de além mar de sonhar com uma mudança.


Setembro 2020

Agradeço que econtramos um apartamento nos Barricks para morar e ter o nosso cantinho. Agradeço que aceitam a Pandora e queé pequeno o suficiente para nos adaptarmos com um vida um pouco mais simples com menos coisas. Agradeço que é silencioso e fácil de limpar.
Agradeço que consewguimos mudar mesmo sem ter dias de folga para ambos. Agradeço que o clima está perfeito para trabalhar lá fora e que consegui passar pelo pior do verão. Agradeço por conseguir me divertir bastante no meu trabalho.



Outubro 2020
Agradeço que vendemos todos os móveis que precisávamos e liberamos o storage room. Agradeço que meu corpo colocou um limite em meu esforço diário sem ocasionar um acidente ou fazer mal para os outros. Agradeço pela nova casa que é bem calma e  vizinhança tranquila. Agradeço pelo Phillis que mesmo com uma passagem tão rápida na nossa vida mostrou como tudo é tão frágil inclusive nossa saúde mental. Agradeço também pelo meu primeiro halloween oferecendo doces. Mesmo com a pandemia tive algumas princesas e monstros vindo buscar.


Novembro 2020

Agradeço por ter todo o equipamento necessário para enfrentar o inverno entregando cartas e pacotes na rua, está começando. Tivemos nosso Thanksgiving em casa, somente nós por causa da Pandemia e somos muito agradecidos por ter comida, casa e saúde. No final das contas isso é o fundamental e não tem como reclamar. Demos um pulo em Port Elizabeth num dia de folga e lembrei de quando o pai nos visitou. Sou agradecida pela minha irmã ter trazido ele. Agradeço também penas paisagens maravilhosas no caminho do trabalho e por ter conseguido organizar meu altar. Agradeço!



Dezembro 2020

Eu agradeço por ser útil na entrega de tantos pacotes e presentes e mais ainda por não precisar de nada nesse Natal. Em meio a tantas "coisas"que precisam ser compradas, dadas e entregues, eu posso dizer que sou afoturnada em não precisar de tanto para viver. Talvez essa tenha sido a maior lição desse ano: viver simples e cuidar do que é fundamental: família, saúde, equilíbrio entre trabalho, lazer e sonhos. Agradeço pela minha árvore de Natal Charlie Brown que não mata nenhuma árvore, agradeço por ter sobrevivido a entrega de cartas numa tempestade northeaster, agradeço pelos céus fenomenais que vi quando ia e vinha do trabalho. Agradeço também que justiça foi feita e a chefe bully foi afastada no começo do mês, assim tivemos paz no pior mês do ano.











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