Wwoof –Itália – quarta-feira – 23_03

O tempo está esquentando aos poucos. Hoje a temperatura estava bem agradável a ponto de conseguir usar camiseta de manga curta, mesmo com o vento frio que batia. O trabalho também não foi leve. Várias pequenas missões: organizar os canos de irrigação para tirá-los do caminho entre as oliveiras, tirar com a enxada todos os matos que estavam ao redor de cada oliveira porque elas precisam “respirar”, depois tivemos que espalhar a compostagem tanto no campo onde arrancamos os repolhos quanto no meio das oliveiras. Literalmente joguei “merda” para todo o lado, fazendo a compostagem voar da pá. Aquilo foi libertador. 
Apontando para onde a "merda"precisava voar...
Paolo disse que ia cortar os matos da região onde os repolhos estavam – vou chamar de área de horta porque logo vamos plantar batatas – mas no final das contas o cortador não funcionou bem porque estava perto da cerca demais. Aí ouvi o grito:

- Niva!!!!! (é assim que ele me chama) o cortador não vai até a cerca, isso vai ter que ser com a mão.
A vista do escritório. Difícil...

Bem, eu já percebi que tenho um certo prazer de arrancar coisas que não deveriam estar naquele lugar. Mas ali tive que lidar com um sentimento de raiva que veio sei lá de onde, sem motivo algum. Bem que minha acupunturista e mestra chinesa me disse que preciso lidar com a terra... Vista linda no “escritório” e eu lidando com alguma coisa desconhecida de dentro de mim que não era muito prazerosa. Enfim, fui arrancando com a mão, com luvas, todos os matos grandes que estavam perto da cerca. Vários cortes depois em mãos e braços, irritação porque os pico-picos eram pequenos e entravam no tecido da calça e da camiseta e muito mais na luva que não eram de borracha, eu terminei o lado da cerca que precisava ser retirado. Greg continuava nas olivas com a enxada, assegurando que elas poderiam respirar. Ambos terminamos o que fazíamos e fomos jogar a compostagem por tudo.  E dá-lhe pá voadora por tudo. Fizemos o ex-campo de repolhos e futuro campo de batatas, e dois corredores entre as olivas.

Ainda do escritório...

Almoçamos a pasta deliciosa de sempre e fomos para casa encontrar com o amigo alemão, que já estava acomodado em Tenno. Isso significaria beber vinho à noite com ele, porque ele é meu companheiro de vinho... Daí ele não precisaria dirigir.

Bem, fomos dessa vez para Mori. Mori foi sempre a razão de eu ter escolhido essa fazenda, mas agora que estava perto, eu fiquei meio sem ação. Esse é o problema de criar expectativa. Foi de lá que meus bisavôs e tataravós saíram, mas eu também sabia que a cidade tinha sido destruída algumas vezes. Inclusive destruindo a documentação do meu bisavô...

Pois bem, todo mundo no carro, fomos em direção a Mori – 30 km de Tenno – e chegamos lá com os sinos da igreja tocando fortemente. Mori não tem as paredes enormes de montanhas que vemos em Tenno. Depois de passar uma delas, tudo fica um pouco mais baixo. Bem, digo isso comparado com o que vemos todos os dias aqui... É praticamente o cenário de Santa Catarina, e talvez, por isso eu veja tanto sentido deles terem ido todos para as montanhas de Rio dos Cedros, Indaial, Benedito Novo...

Chegamos em Mori, sino tocando, e o vilarejo era maior do que pensávamos e também bem mais novo do que pensávamos. O sentimento que pairava era de querer se ver livre de algum passado. Pudera, muita carnificina aconteceu ali. E fico me perguntando como foi que esse pessoal bélico se embrenhou em montanhas tão distantes para disputar o território. Mori é um vilarejo quieto, que tem velhos para todos os lados, mas casas coloridas, uma praça moderna, com um chafariz arredondado no meio. Ironicamente muitas casas carregam a data de... 2011, em sua frente. É como aquele primo seu que é brega mas que faz um esforço gigante para ser “in”...  A cidade fica tentando dizer o tempo todo que é moderna, que tudo o que ali aconteceu é passado. Enfim sentimentos contraditórios em mim, fui ao cemitério. Lá achei alguns Bonas, alguns Canalis, para a minha surpresa, mas o que me impressionou foi a Teresa Bona. Nascida em 11/1912 e morta em 06/1913. Um bebezinho. Ela deveria ser alguma sobrinha ou priminha de meu bisavô, que chegou ao Brasil em 1876 com 16 anos.
Chiesa S. Stefano em Mori. A torre foi recuperada. O restante da igreja foi reconstruído

Cemitério de Mori

A Teresa não chegou a ter um aninho... Uma tristeza ver lápides assim.

O "trinco" da igreja de S. Stefano 

S. Stefano por dentro. E a vigília de Páscoa acontecendo.

Mori, colorida, e nova.

O aviso conta um pouco da história da cidadezinha...

Depois de dar uma volta esquisita em Mori fomos para Arco. Outra atmosfera. Me lembrou muito San Pedro de Atacama. O vilarejo é antigo, medieval, mas tem um clima de juventude que paira por tudo. Várias lojas, todas focadas em escalada, biking, treking. Gente cool por todo o lado. Cafés, restaurantes, lojas de temperos, vinhos... Tudo abençoado por um castelo láaaaa em cima de um paredão de pedra enoooorme que gruda no vilarejo. Não é à toa que Arco é o point de qualquer um que seja louco por escalada. É como se Chris e Greg fossem crianças e estivessem em uma loja de doces. En-lou-que-ci-dos, sem ter certeza para que lado olhar.
Igreja evangélica em Arco. Muito linda.

Um dos parques principais de Arco.

Igreja de Arco. Nota pro anjinho pendurado lá em cima.

A fonte da praça principal.

Enfim, Arco é legal. Mori tenta ser, mas precisa de um core business para tal. Mesmo que seja a história sangrenta que a rodeia.
E que o anjinho proteja todas as almas que vivem na guerra...

A reflexão de hoje? O quanto estiveram desesperados meus tataravós para saírem correndo de uma localidade que tinha tudo para ser bucólica, embarcar em um navio, sem garantia de chegada e, se chegasse, em um país super estranho, sem garantia de volta ou de rever amigos e familiares. Bem, a conclusão? A guerra faz isso. A guerra consegue ser algo tão estúpido que mesmo sem matar efetivamente, consegue acabar com a vida de gerações inteiras.



Comentários