Sobre formaturas, choros e abismos




Um aperto. Um choro que não sei bem de onde vem. Alguém já tinha me dito que emoções são como cavalos selvagens... Não há como segurar.

A formatura do filho veio carregada de significados. Todos que eu não tinha prestado atenção até a cerimônia acontecer. E aqui vão algumas coisas que fecharam o círculo e que talvez precisem de um luto para poder seguir em frente.

Eu me formei como mãe. Foi isso. Tenho a prova viva de que, pelo menos isso, eu fiz direito nessa vida.

Ver o filho se formar fez eu pensar e tentar lembrar onde eu estive nessa caminhada. E um montão de flashes passaram pela minha cabeça como se estivessem correndo para uma caixa de onde não vão sair mais.

Ao mesmo tempo que olho para ele e vejo que é homem feito, que não precisa mais de empurrão, de mão para segurar, olho para trás e penso: onde estão todos esses anos que fizeram ele chegar aqui?? Cadê o meio do caminho que passou e eu nem vi?? Como assim, não volta mais??

E aí vou lembrando de coisas pequenas: da cara cheia de chocolate que ilustrou a foto do convite e do momento exato em que aquilo aconteceu. Do menininho tentando andar, cheio de fraldas, que adorava mexer na chave da porta e dançar... Das infinitas vezes em que éramos só eu e ele, como uma equipe. De quando ele queria montar uma gangue para ir bater nos meninos que roubaram o boné e eu expliquei que guerras são feitas assim. De quando ele caiu do skate, quebrou o dente e eu, com o coração na mão, disse: lave a cara e volte lá para a rua. E aprenda a cair! De quando ele mobilizou a família toda pelas enrascadas em que se meteu fora do país e eu não tinha ideia da força que me deixava em pé ainda... De quando me contou que saltou de páraquedas depois de 3 dias sem dar notícias e eu queria espancá-lo mas fiquei feliz de ouvir a voz no telefone. Das vezes que pequeno, ele foi comigo para trabalhos, faculdade, visitar clientes... e de quando tudo se virou e ele passou a me buscar na faculdade com o carro dele, me levar ao médico... Quando foi mesmo que os papéis se inverteram?

No meio da cerimônia dele me dei conta de que o momento que esperei tanto na minha vida tinha chegado. Esperei avidamente esse instante que provava que, afinal, tudo deu certo! Esperava isso porque sempre todos os meus passos foram julgados.

Minhas decisões, contrárias ao que a sociedade impõe, sempre me levaram a ser apontada como a errada. Pedi a separação porque não queria que ele crescesse em um ambiente de brigas. Me matei de trabalhar e levei ele comigo porque não queria centrar a minha vida na dele, nem passar esse peso para ele, mas mostrar que o trabalho constrói. Tive uma vida livre, quase revolucionária, nem tão pura como todas as mães devem ser, e coloquei meu filho em enrascadas como ter que explicar o que era a Marcha das Vadias para os colegas... Mostrei para ele que minha escolha era ser diferente do que está aí estipulado, mas que ele teria a liberdade de ser quem ele escolhesse ser.

E sei que ele teve que se virar do avesso para entender tudo isso.

Larguei ele para os desafios. Nunca fui protetora. Eu realmente confiei que ele tinha tudo para ser melhor do que eu. Fui a que empurrava para o abismo porque acreditava muito nas asas dele. E ele voou. E todo o meu trabalho de mãe, que antes parecia tudo errado, hoje traz resultados. E, em vez de ficar feliz, de sair gritando que eu consegui, eu choro. Emoções são coisas bestas, não?

E aí? Porque eu choro? Talvez porque essa cerimônia – e o ser humano precisa de rituais para entender certas passagens – tenha sido a cerimônia da minha formatura também. Talvez seja a hora de sair da beira do abismo e achar o que fazer. Não preciso mais empurrar ninguém. Porque ele já sabe saltar sozinho. E voar.

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