conversa bilíngue em presente do indicativo



Dia de Todos os Santos. Feriado aqui em Sevilha. Fico em casa, primeiro rodeando o meu computador e o artigo de metodologia da minha orientadora. Organizo tudo. Café, louça. Arrumo a papelada para estudar. Olho o face. Mando alguns "olás" para os meus amigos queridos. Abro janela e porta para o terraço. Dia lindo! Frio razoável, mas sol lindo. Hum, bom para lavar roupa. Coloco as roupas na máquina, sento no sofá - ainda não achei posição cômoda na minha casa para o computador e os livros e horas de estudo - e começo a ler/refletir/escrever/fichar. Converso comigo. Digo que minha pesquisa deveria ir por esse lado porque dessa forma é mais adequada. Ou talvez, outro tipo de perspectiva de relato de vida. A roupa fica pronta na máquina. Pronta para ser estendida. Me animo. O terraço está realmente convidativo. Penduraria roupa lá o dia inteiro. Saio com as roupas no ombro (cesto para que?) os grampos em um saquinho reciclado (o que veio dentro dele mesmo?)e abro a porta de ferro que me liberta pro terraço. Pela primeira vez, em um mês aqui, encontro vizinhos. Um casal simpático, de seus 60 a 70 anos discutindo como tirar uma foto. Passo por eles. Dou bom dia. Respondem distraídos. Penduro as roupas. Ouço mais conversas sobre a máquina de fotografar. Resolvo ir para casa. Não, mudo de ideia.

Ofereço:
- Quieren que yo saque las fotos? Soy periodista. (não sei porque, mas senti que deveria explicar a eles que poderia fazer algo decente...)
Os dois me olham e aceitam ressabiados. Dizem que a máquina não os mostra.
Ligo a máquina. É, estava desligada. Pergunto onde querem a foto. Tiro. Pergunto o que querem que apareça na foto.
- A seta!
Tiro a foto com a seta (Parasol) atrás. Digo que deve ser com flash porque está contra a luz. Agradecem. Devolvo a máquina. Perguntam o que faço aqui. Me desculpo pelo meu espanhol horrível e explico que sou do Brasil. Ela:
- Lejos!
Digo que estou estudando, ela pergunta o que:
- hago doctorado en comunicación. Estudio los movimientos sociales e sus comunicadores.
Fazem cara de respeito. (Diacho, pq sempre precisamos de um título importante para ter respeito??)

Me contam que possuem um apartamento aqui para os fins de semana. São os dois jubilados (aposentados), mas que moram em Marchena (não faço nem ideia de onde fica). Ele percebem que não faço nem ideia de onde fica. Contam que já trabalharam duro e que agora é hora de curtir a vida. Prometeram que logo que se jubilassem iriam morar no pueblocito de Marchena. 15 dias depois que ela se jubilou começaram a procurar um "piso"(apartamento) no centro de Sevilla só para vir curtir a cidade. E é o que fazem. Passam a semana em Marchena (que é um ovo) e no final de semana vem passear.
Contei que "me encanta" a cidade de Sevilla. Que adoro saber que tem uma coisinha, um recanto, para descobrir todos os dias. Que o "velho" cheio de histórias daqui é fascinante para alguém que viveu sempre no novo mundo.
Aí eles viram para mim e me contam: Marchena é mais velha que Sevilla. No nosso quintal tem uma muralha que foi construída pelos romanos para proteção. Os árabes iam se "bañar" nesse pueblocito... Não ouvi direito.
- Una muralla?
-si, grande, nuestra casa está pegada con ella.

Eu continuo sem entender. Ele explica:
- es parte de mi casa. Yo subo para ver la ciudad toda. Si el inspector necesita adentrar, tiene que pedir a mi primero.
Eu pergunto de novo:
- una muralla antiguo es tu patio?
- si, ella contesta.
Faço cara de "estupendo". Y me quedo de boca abierta.
Ela continua explicando que achava que a muralha deveria ser protegida, que quando as pessoas fossem morrendo eles deveria destruir as casas ali e deixar só a muralha.
Concordei.

Perguntam se moro aqui. Digo que sim e aponto pra minha gradezinha que dá passagem para o meu mundo. Eles dizem que estão aqui aos finais de semana. Comento que é tudo muito silencioso aqui e é fabuloso ser em pleno centro. Disseram que achavam que com a seta as coisas iam ficar barulhentas. Comento que no final de semana passado havia um festival de música ali. E ela me completa: si, pero a la media noche cesó. Concordo. Decidimos voltar aos nossos afazeres.

- Soy Maria Luísa, se necesitas de algo.
- Encantada, Maria Luísa.
E pronto, volto a casa. Olho o livro de metodologia. Pego o computador e procuro no mapa onde fica Marchena. Um pontinho onde eu achava que não tinha nada. Penso: Bah. Muita gente pisou essa terra antes da gente, hein?

Comentários

  1. So many mysteries in the world, and so many small ways to discover them.

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  2. Hum, dont think they are mysteries. I think we have these little things always around us, but we never pay attention. The secret of being alived is pay attention, in my opinion... :)

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