O kalanchoê olhando a neve na janela |
Um novo ano começa e as reflexões abundam. Há algum tempo tenho me conectado com algumas filosofias de entendimento da saúde e dos ciclos naturais do corpo como a ayurveda. A menopausa nos obriga de um jeito bem radical a repensar os hábitos e a forma como temos encarado o mundo. Muito material - finalmente - tem sido publicado, discussões feitas acerca dessa fase na vida feminina. Os detalhes das minhas percepções vou deixar para outro texto. Nesse é importante apontarque foi uma mistura de sintomas da menopausa, o desastre que é o sistema de saúde americano e as incorrências da vida - mudança de trabalho - que me fizeram buscar a ayurveda.
De um jeito bem resumido a ayurveda acredita que os alimentos são os remédios que precisamos para mantermo-nos saudáveis. Assim, dependendo da personalidade e tipo do corpo ou do "dosha" e da estação do ano em que estamos, é importante escolher determinados alimentos e determinadas maneiras de prepará-los para manter a saúde e o equilíbrio energético. O centro da ayruveda é o fogo digestivo, que influencia o restante das funções corpóreas.
Começar a comer e viver de acordo com a ayurveda pode significar quebrar certos costumes que carregamos a vida toda, como esquentar o mel, ou comer banana junto com amidos (ambos produzem toxinas durante a digestão). Há ainda a questão da estação do ano. Eu, por exemplo, adoro nozes e castanhas, que têm o seu consumo recomendável em estações mais frias para o meu dosha. Evitá-las durante primavera e verão é um sacrifício...
Não há dúvidas que a vida é feita de ciclos. E esses ciclos trazem o equilíbrio (=saúde) que tanto buscamos. A natureza é sábia e se prepara para as estações do ano, o alimento tem uma estação certa para ser colhido, e nosso corpo, que é parte desse processo queiramos ou não, também vive em ciclos, tanto de estações do ano quanto de tempos mais longos. Eu tenho feito um exercício de perceber como o meu corpo reage a mudança no clima, e confirmei algo que eu já sabia há algum tempo: essas mudanças têm um profundo reflexo dentro de mim. Desde ficar mais sonolenta em dias de chuva e neve - que na natureza obrigaria a gente a se recolher - quanto ter a energia renovada quando o sol está brilhando. Somos parte dessa natureza onde tudo nasce, cresce, se transforma e morre. Minha vizinha de 83 anos, ativíssima e super atenta aos movimentos do mundo, também explica a ciclicidade da história. A cada notícia chocante recebida, ela desabafa: "estou vendo tudo de novo. Já vi isso acontecer no passado..." Minha amicíssima, professora de história também apontava como a história acontece em ciclos e por isso que as guerra continuam.
Nesse início de ano, que na verdade é o início de um ciclo "virtual" criado a partir de um calendário feito por seres humanos, muita gente faz a lista das resoluções de ano novo. Um plano de possibilidades que se queiram alcançar nas próximas doze fatias temporais. Por mais que seja artificial, essa perspectiva de um ano acabando e outro começando pode renovar as energias e a visão de vida de cada um de nós. A gente celebra conquistas nas fatias de tempo passadas e planeja as conquistas das próximas 12 fatias e assim a gente consegue ter a ilusão de controle e ação (eu já entendi que pouco controlamos nessa vida).
Mas uma dessas contas de redes sociais que mostra a rotina de pessoas que decidiram viver em consonância com os ciclos da natureza, seja em vias rurais plantando e colhendo, seja em âmbitos mais esotéricos e energéticos, apontou que o ano novo não é o momento mais adequado para se fazer as resoluções de ano novo. No hemifério norte é inverno, o tempo é mais frio ou muito frio, e os dias com muito mais escuridão do que luz. Definitivamente um tempo de recolhimento, de não tomar muitas atitudes abruptas. Segundo essa conta, o tempo ideal para as resoluções de ano seria no início da primavera, quando toda natureza está explodindo em vida, brotando, acordando da hibernação necessária para recuperar as energias, se preparando para se espalhar, reproduzir, criar. A afirmação me fez refletir. Há sentido, há lógica. Alguns comentários apontaram para as dificuldades práticas de levarmos esse pensamento a termo, porque nos dois hemisférios a primavera seria em meses diferentes do ano. Oras, não precisamos iniciar um ano todos do globo ao mesmo tempo. Podemos colocar nossa energia nas resoluções do ano virtual ou do ano da natureza.
No final das contas, o movimento continua cíclico, mas seria individual.
O que me ajudou a chegara essa conclusão foi um kalanchoê na minha casa. É, uma planta.
Minha sala no apartamennto do quinto andar tem a abundância de luz solar o dia todo, inclusive por meio de uma clarabóia. Então, por mais que estejamos no inverno, as plantas todas podem continuar vivas, se desenvolvendo ou estacionadas. A maioria delas dá flores e se estica pelas paredes durante a primavera, verão e outono. O manjericão e a ora-pro-nobis são exemplos claros desse comportamento. Tenho uma begónia que adora se florir sempre. O ano todo ela está produzindo as pequenas florzinhas que caem e colorem o chão.
Ano passado fiz umas mudas de um kalanchoê-pai que não estava mais florindo. Continua dando folhas. um dos filhotes ficou grande e viçoso com folhas enormes - e nenhuma flor - e uns outros pequenos galhinhos começaram a se desenvolver em outro vaso. Passei o ano inteiro sem flor de kalanchoê, entendendo que tudo tem o seu tempo. Até em meados de novembro, quando começou a esfriar e ficar mais escuro, o vaso com os galhinhos começou a crescer com certa rapidez. E deu flores, muitas flores de um vermelho vibrante a princípio que a gora se transformou em laranja. Esse kalanchoê em flor, olhando lá fora a neve caindo é o símbolo dos ciclos individuais. Ele não estava pronto para florescer durante a temporada de flores e resolveu florescer quando conseguiu.
O surpreendente é que ele "mora" numa janela perto da lavanda, que já faz três anos que não dava flor. Ontem eu vi uma pequenina flor roxa se desenvolvendo nesse vaso.
No final das contas, esse kalanchoê resolveu contrariar as chances e florescer quando se menos esperava. Não esperou a primavera para realizar o seu mais belo propósito. E não só realizou-o fora de estação como inspirou a colega lavanda a sair do seu casulo e florescer - também fora de época.
E você, acha que precisa esperar a primavera, a segunda-feira, o novo salário, o final de semana para florescer, ou já tem as ferramentas para fazer isso agora? Por que então esperar a primavera?
A lavanda que decidiu não esperar a primavera |
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